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Rodrigo Cass por Ana Paula Cohen. Publicado no livro Bolsa Pampulha 2010-2011, Museu de Arte da Pampulha,  pp. 132-135.

ISBN 978-85-98964-07-2

 

 

 

Qual é a sua formação?

 

Durante nove anos, morei em uma instituição religiosa, e recebi uma formação baseada na espiritualidade carmelita, que tem na contemplação seu foco fundamental. Tive aulas de pintura e me tornei iconógrafo em 2001. Concluí o bacharelado em artes plásticas em 2006, em São Paulo. Estudei pintura e desenho com a artista Leda Catunda, além de ter estudado filosofia e teologia.

 

Quais foram as principais razões para você se inscrever no Programa Bolsa Pampulha e aceitá-lo quando foi selecionado? 

 

Havia morado em Belo Horizonte em 2007 e 2008. Era vizinho do Museu e lembro-me da primeira vez que o visitei. Fiquei impressionado com o fato de aquela arquitetura ser um museu. Parecia que existia uma inversão, aquele monumento era a obra em si. Na época, havia uma exposição sobre os salões de arte com obras de diversos períodos. Em contraste com as obras que estavam expostas, chamaram-me atenção os tipos e as cores dos diversos revestimentos do Museu. Comecei a frequentar o MAP e a acompanhar o trabalho dos artistas bolsistas das segunda e terceira edições. Aceitei a oportunidade de uma vida como residente em Belo Horizonte e o desafio de trabalhar com um “museu-obra de arte”.

 

O que você diria que foi mais importante para sua prática artística durante esse ano de residência em Belo Horizonte, participando do Programa?

 

O tempo prolongado para produzir, em contato direto com um museu que está constantemente sendo construído, a cada nova exposição. Tivemos um ateliê coletivo no centro de BH, ali podíamos conviver entre bolsistas e permanecer por um tempo prolongado na cidade. Eu frequentei muito o Mercado Municipal e o Mercado Novo, lá se acha de tudo, muitas lojas de materiais descartáveis, e comecei a comprar papéis de embalagem, sacolas plásticas e facas, e a trabalhar com elas em vídeo. Chamou-me a atenção o fluxo do grande centro, muita gente para pouco espaço, a cidade não contém mais sua população. Essa relação com a cidade aparece na obra “Arma branca”, no curto tempo em que a sacola pode conter as facas que deposito. A faca é o objeto mais perigoso que tenho em casa; a um só tempo, é arma e utensílio. Depois, pensando em fazer o trabalho para apresentar no Museu, as facas passaram a ter uma relação com as diversas colunas de inox que sustentam o espaço, atravessando-o. 

 

Nada no espaço do MAP é neutro. Os revestimentos são muitos: alabastro, inox, cortinas de tecido, vidro, espelho, madeira. No final, todos os vídeos que apresentei no Museu foram pensados para serem projetados na arquitetura, em superfícies específicas.

 

O seu trabalho traz sempre a ideia do continente, do que contém e do que está contido. Ou talvez da impossibilidade de conter. Você pode falar sobre o que interessa a você nessa ideia e em que trabalhos você acha que ela aparece com mais clareza?

 

Trabalho com o mínimo de elementos, de forma direta e econômica, para alcançar um resultado sintético ou que sintetize assuntos de que quero tratar. Em “Copo americano” a ideia de continente está mais evidente, pelo fato de o copo ser de fato um continente. Escolhi o copo mais simples que pudesse encontrar. Porém, no vídeo, o copo cria uma outra relação com a ideia de continente; em vez de conter a água, ela o cerca, como a água cerca uma porção de terra. Uma ação mínima, um mínimo deslocamento da garrafa em relação ao copo modifica tudo.

 

A ideia do que está contido aparece também em “Reserva própria”, onde trabalhei com as cortinas do auditório. Chamou-me atenção o fato de as cortinas partirem do teto e tocarem o chão, arrastando-se por ele. Há uma queda, um movimento para baixo. Eu quis evidenciar isso com o vídeo, onde faço correr água sobre ela com intensidade variável, e fiquei surpreso com a projeção dessa imagem na própria cortina. É como se eu tivesse iluminado uma área da cortina onde de fato escorresse água. Uma reserva é algo guardado, reservado para depois, território a ser explorado; nos museus e bibliotecas, a reserva é uma parte da coleção não aberta ao público. Uma das expressões que mais me chamaram atenção nas nossas conversas foi “levar a público” um processo. “Reserva própria” surge daí, de levar a público algo já acessível a ele, mas talvez não percebido.

A sacola plástica que aparece em “Arma branca” também é um continente, traz a ideia do que contém e da impossibilidade de conter. As facas têm um tempo de permanência dentro da mesma e caem jogadas ao acaso, formando desenhos únicos. Mas, sobretudo, há uma ideia de violência nessa maneira de conter. Por fim, o trabalho “Continente econômico” extrapola a ideia de algo que está contido, através da desproporção agigantada da escada que segue em direção a um copo com água.

 

 

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